quinta-feira, 7 de junho de 2012

11. Freguesia Santa Cruz do Rio Pardo

11.1. Esclarecimentos 
A Capela São Pedro, tem registros de nome para Santa Cruz do Rio Pardo desde novembro de 1862.
Em 1867 o governo paulista reconhecia o lugar sob a denominação Santa Cruz do Rio Pardo. A oficialização, no entanto, somente ocorreria quase uma década depois, com a edição da já mencionada Lei Provincial nº 71, de 20 de abril de 1872, que elevou "à categoria de Freguezia com a invocação de Santa Cruz do Rio Pardo, a Capela de São Pedro no município de Lençóes."
Esta foi a verdade histórica e legal, difundida em 1977/1978 (Prado), fundamentada conforme a Enciclopédia dos Municípios Brasileiros (IBGE, Volume XXX, Santa Cruz do Rio Pardo, 1965: 94-97).
A Lei nº 71 teve por origem o Projeto Legislativo nº 69, de 08 de fevereiro de 1870, que tramitou na Assembleia Legislativa de São Paulo. Documentos anexos ao Projeto, no entanto, deixam dúvidas quanto à ciência dos Deputados de qual localidade tratava-se Capela São Pedro, conforme o artigo 1º daquele Projeto 69: "Fica elevada a Capella de S. Pedro no municipio dos Lençoes á freguezia, com a invocação de São Pedro dos Campos Novos." (ALESP, EE 72.15).
Aparentemente pareceu tratar-se de equívoco, em face de rasura sobre ‘'São Pedro dos Campos Novos' para dar lugar ao manuscrito: 'Santa Cruz do Rio Pardo'. 
No mesmo processo, folhas 06, a Secretaria de Governo – Poder Executivo, também confundiu nomes, ao recomendar aos senhores deputados melhores esclarecimentos na proposta "que eleva à Freguesia a Capela de São Pedro dos Campos Novos", em face de informação, anexada, do Padre Capelão Andre Barra, de 19 de março de 1870, "que a Capella São Pedro não pode ser elevada a Freguezia por que seu pessoal e a falta de Igreja não permittem sua elevação. He o que tenho a informar a V. Revma ... ainda em tempo informo mais, que neste lugar (São Pedro) ha uma Igreja de vinte poucos palmos e não ha numero de almas sufficientes para Freguezia." (ALESP, EE 72.18.8).
A própria Assembleia Legislativa Provincial assim já havia disposto em 1872, que o lugar não tinha condições de ser guindado à Freguesia, por não ter prédio decente para a Igreja.
Ao Chefe do Executivo independeu qualquer esclarecimento, ao sancionar a Lei Provincial nº 71, de 20 de abril de 1872, elevou "à categoria de Freguezia com a invocação de Santa Cruz do Rio Pardo, a Capela de São Pedro,"
Com a disposição legal, sem retificação, as autoridades da Província de São Paulo confirmaram como Santa Cruz do Rio Pardo a antiga Capela São Pedro.
Foi importante conquista para a localidade com encerramento das reivindicações e das discussões para as quais muito contribuiu o deputado provincial Emygdio José Piedade.

11.2. O histórico da formação
A condição de freguesia fundamentava-se na Constituição de 1824, ou seja, as povoações eram assim elevadas por iniciativas do poder civil, pelas Assembleias Provinciais, cumprindo aos bispos confirmá-las, com o significado de lugar formado, organizado e territorialmente delimitado em zonas urbana e rural, com divisas definidas e extensivas sobre os bairros [Capelas] que lhe seriam subordinados.
A Lei nº 71, de 20 de abril de 1872 foi sucinta: "Art. 1.º - Fica elevada a Capella do S. Pedro no Municipio dos Lençóes a Freguezia, com a invocação de Santa Cruz do Rio Pardo”, e o parágrafo único, “O Governo fixara as divisas da Nova Freguezia."
Na condição de freguesia, em cumprimento à Lei 71, de 20 de abril de 1872, fez-se o primeiro registro oficial de divisas para Santa Cruz do Rio Pardo, descrito em documento oficial da Câmara Municipal de Lençóis Paulista, de 07 de novembro de 1872, encaminhado ao Governo da Província, conforme já informado.

11.3. Confirmação eclesiástica
Nos tempos do Brasil Império, o Estado e a Igreja ajustava-se juridicamente, o que equivale dizer que uma lei somente teria validade se ratificada pela Igreja, assim como todo e qualquer ato jurígeno eclesiástico dependeria, por sua vez, da confirmação do estado, como complementações harmoniosas, raramente com arbítrio do Imperador.
De 13 de janeiro de 1873, a Carta de Provisão Eclesiástica confirmou o ato da Lei nº 71 de 20 de abril de 1872, vigorando desde então as mesmas divisas que lhe foram dadas pelo poder civil.
Frei Papim em um artigo ‘Festa de São Sebastião - Dia da Cidade’, fez publicar a transcrição da Carta Eclesiástica "Aos que esta Provisão virem, saúde e paz para sempre em o Senhor. Tendo a Assembléia Legislativa Provincial por lei n. 71 de 20 d'abril de 1872 elevado à Cathegoria de Freguesia (Paróquia) esta Capella de Santa Cruz do Rio Pardo do Município de Lençóis, e attendendo ao que me representou Joaquim Antonio da Silva por parte do povo d’aquele lugar, hei por bem pela presente confirmar como por esta Provisão confirmo, erijo e canonicamente instituo aquella Freguesia na forma do Sagrado Concílio Tridentino, concedendo-lhe todos os direitos, privilégios, honras, insígnias distinções que lhe pertencem como Egreja Parochial, que de hoje em diante fica sendo, vigorando as mesmas divisas pelo que diz respeito a Estolla, que pelo Poder civil lhe foram dadas. Esta será publicada à estação da Missa Conventual dum dia festivo e registrada no livro do Tombo da Matriz para a todo tempo constar. Dada na Câmara Episcopal de S. Paulo, sob meu signal e sellos das armas, aos 13 de janeiro de 1873." (Frei Lourenço Maria Papin, in Debate nº 1241, de 16 /01/2005, com os esclarecimentos que a Carta foi publicada e registrada no livro do Tombo da Matriz, conforme determinado pela Câmara Episcopal de S. Paulo).
Para a consagração fez-se presente o Bispo Diocesano de São Paulo, Dom Lino Deodato Rodrigues de Carvalho, em data de 13 de janeiro de 1873, ocasião em que se inaugurou o novo templo religioso – onde a atual matriz de São Sebastião, e lhe foi nomeado o primeiro vigário, o padre João Domingos Figueira.
A confirmação de instituição canônica à freguesia e designação do Padre Figueira, como vigário encomendado, foi expresso num documento do Bispado de São Paulo ao Presidente da Província, de 15 de janeiro de 1873 (ALESP, FALP 531, CO 073.001 / 073.1.1).
A igreja inaugurada durante as solenidades de 13 de janeiro de 1873 foi aquela pretendida por Manoel Francisco Soares, doador do terreno, e construída pela população com ajuda financeira de Joaquim Manoel de Andrade, sob o comando do padre João Domingos Figueira.
Soares, após o evento, teria cessado sua participação na história local, acometido por tuberculose pulmonar, segundo memórias parenteiras, falecendo em Botucatu aproximadamente aos 78 anos de idade, a considerar Listagem Eleitoral de 1859 para São Domingos. No sertão antigo dizia-se que o clima da serra era o ideal para doentes tísicos.
A história para 1873 revela o templo religioso construído numa pequena parte da atual Praça Dr. Pedro César Sampaio, a então praça Anchieta, a partir de um imaginário sequente da travessa [do] Manoel Herculano, pelos fundos da Igreja, ultrapassando aonde a Avenida Tiradentes e chegar à rua Benjamin Constant, e a fazer frente com a atual Rua Dr. Alziro de Souza Santos.
Tal indicação tornou-se referência do quanto expandira do povoado desde 1851, e a importância maior de freguesia provisionada estava quanto o aspecto eclesiástico-civil, com a criação do Cartório de Registro Paroquial para lançamentos de batismos casamentos, óbitos e censos – listas dos jurisdicionados ou fregueses para fins religiosos, civis e militares, inclusive firmar atestado de bons antecedentes de seus paroquianos, para validade do ato em si mesmo, qual seja, para garantir sua eficácia perante terceiros.
O reconhecimento religioso para Santa Cruz do Rio Pardo refletiu-se nas melhorias político-administrativas, com sua integração ao rol de paróquias existentes na Província de São Paulo como apresentação e reconhecimento de Governo para destinações de recursos para despesas com a manutenção da matriz, além dos pagamentos pelos serviços civis prestados pelo vigário, como os alistamentos, censos, escriturações e expedições de documentos diversos com fé pública.
Da mesma maneira, com tal grau de elevação, o padre passava a residir na localidade, cumprindo-lhe, por disposição canônica, a satisfazer os deveres paroquiais para com Deus e a sociedade. Na condição de Vigário Encomendado para Santa Cruz do Rio Pardo, Figueira recebia dos fiéis pelos serviços sacerdotais prestados, acrescidos dos valores de direitos da Câmara Eclesiástica.
A estrutura local estabelecia a nomeação do Fabriqueiro para a Matriz da Paróquia e o Escrivão da Vara da Comarca.
O Fabriqueiro era encarregado e cuidador das rendas de uma igreja, o zelo das alfaias, paramentos e toda administração interna da mesma igreja para como nomeado. Luiz Antonio Rodrigues foi fabriqueiro por anos seguidos, por volta de 1883/1885, e Tiburcio Antonio dos Santos, nos anos de 1895, cidadão dos mais conhecidos fabriqueiros de Santa Cruz.
Vicente Finamore, por anos, respondeu pelo cargo nomeado de Escrivão da Vara da Comarca, conforme observado em 1883 e 1885.

11.4. O primeiro Vigário e os sucessores
—Padre João Domingos Figueira
O Padre João Domingos Figueira tem história conhecida, conforme documentos informados pelo Reverendo Padre Hiansen Vieira Franco.
Português, nascido aos 14 de abril de 1810, na Freguesia do Estreito de Nossa Senhora da Graça de Camara dos Lobos, filho de João Domingos Figueira e Maria de Faria, batizado em 18 de abril do mesmo ano – "Livro Décimo Oitavo dos Baptizados da Parochial Igreja do Espirito Santo da Villa da Calheta, nelle a folha cento e sincoenta oito verço”. Transcrita em Funchal, 13 de Março de 1833." (Arquivo da Cúria Metropolitana de São Paulo - ACMSP, Processo de Genere et Moribus. Anotações feitas pelo Reverendo Padre Hiansen Vieira Franco em 1998).
Vocacionado à vida sacerdotal, Figueira iniciou curso no Seminário Católico de Funchal, em 1824, sem conclusão, egresso em 1833, deixando Portugal para residir no Brasil, onde concluiu os estudos para receber ordens sacras. "Em 1839 'os moradores na Freguezia de Caboverde’ pedem ao Bispo de São Paulo a confirmação do Padre João Domingos Figueira para seu Parocho." (Arquivo da Cúria Metropolitana de São Paulo - ACMSP, Processo de Genere et Moribus. Anotações feitas pelo Reverendo Padre Hiansen Vieira Franco em 1998).
João Domingos Figueira foi pároco colado em Cabo Verde-MG, entre 1º de outubro de 1839 "por seu comportamento, lisonjeiras esperanças de bem servir a igreja" a 23 de agosto de 1845 – quando "lá não podia permanecer com ameaças consecutivas de morte” (Adilson de Carvalho - 1998, apud Padre Hiansen 2003: 34).
Pároco ou vigário colado significava o padre, brasileiro nato ou naturalizado, concursado para exercer funções sacerdotais num lugar determinado, mediante remuneração pelo poder civil, comparado assim à categoria de funcionário público e inamovível, somente deixando o cargo vago, em tese, por vontade própria ou morte.
Antes de assumir o capelanato e depois a vigararia de Santa Cruz do Rio Pardo, Figueira estava designado vigário encomendado para a Freguesia (Paróquia) de Nossa Senhora do Bom Sucesso, atual sede do município de Paranapanema (SP) (RG, BN 1003, 1863/1864: Mapa SN e U 1005, 1864/1865: 8-9).
Documentos referenciados identificam Padre Figueira como fazendeiro e dono de plantel de escravos. Seus filhos nascidos em Cabo Verde-MG estão relacionados herdeiros legatários (DOSP, 19/03/1898: 5-7): João Bonifácio Figueira – fazendeiro e ocupante de empregos públicos; Bemvinda Carolina do Espirito Santo, casada com Manoel Gomes Nogueira; Mariana Rosa do Amor Divino, casada com o político e ocupante de cargos públicos, Luiz Antonio Rodrigues; Maria Innocencia da Conceição, casada com José Joaquim Gomes; José Chrisante Figueira, com nome mudado para José Baptista; Antonio Emilio Rodrigues [Figueira], nome alterado para Antonio Baptista.
Consta, ainda, descendente, Maria [Bernardina] batizada em Santa Cruz do Rio Pardo, aos 25 de novembro de 1862, filha de Rozalia, escrava do religioso.
Figura ímpar na história santacruzense, "Padre Figueira liderou diversos movimentos cívicos na região" (Oliveira Zanoni, 1976: 57), fez desenvolver o povoado e meteu-se em política (Rios, 2004: Introdução), com ativa participação na primeira eleição municipal, em 1876, disputada sob o clima de violência, colocando-se ao lado dos derrotados conservadores.
Em 1875 Figueira oficiou ao Presidente da Província, como "conhecedor desses lugares, onde habito à doze annos", para propor e requerer novas divisas entre as povoações Santa Cruz do Rio Pardo e São Pedro do Turvo, além do alerta quanto aos perigos constantes nas travessias dos rios Turvo e São João: "defrontando os interesses temporaes e espirituaes dos habitantes da Freguesia de Santa Cruz, redusindo-os a uma catastrophe de pluvial máxima, quantas a espiritual, com dois rios a atravessar para São Pedro, sem pontes, onde tem naufragado viajeiros com seus animaes." (ALESP, EE 73.27.1).
O padre faleceu em 1878, entre 26 de maio a 07 de junho, espaço entre dois registros de Igreja. Foi sepultado no piso da matriz, próximo do altar (Oliveira Zanoni, 1976: 57).
Durante cento e trinta anos permaneceu incerto quem o sucessor imediato de Figueira, com as informações desencontradas, até as revelações recentes que não foram os reverendos Antonio M Bicudo (Correio do Sertão, 19/07/1902: 3) ou Pedro Gaggino de Montaldo (Oliveira Zanoni, 1976: 61).
Certo foi que o Padre Décio Augusto Chefato, da localidade de São Pedro do Turvo, desempenhou as funções de 'Vigário Interino', a partir de 14 de abril de 1879, ou nesta data informado e assinado em documentos próprios da Matriz.

—Padre Próspero Antonio Iorio
Junqueira informou que Figueira até o ano de 1878, "dirigiu a paróquia, sendo sucedido pelo Padre Antonio Prospero Faria [?], até 1881." (2006: 41).
Efetivamente o Padre Próspero Antonio Iorio, e não Faria, assumiu a Vigararia em outubro de 1879, tendo seu nome lançado como oficiante religioso em documento eclesial do dia oito daquele mês e ano.
Nos tempos de Iorio pretendeu-se a construção de uma nova matriz, em 1881, com imediato levantamento de paredes ao derredor do templo existente, por isso a obra logo batizada de 'Barracão'.
Aparentemente nada havia que justificasse uma nova matriz sobre aquela inaugurada em 1873.
Ora, em abril de 1880, o Governo Provincial, através da Lei nº 85, de 21 de abril de 1880, destinava lucros de uma loteria provincial à Matriz da Santa Cruz, para manutenções e pequenos reparos, uma prática usual de governo em colaborar com o município para suas realizações (Correio Paulistano, 13/05/1880: 2).
Também não ocorrera nenhuma catástrofe natural registrada, e a causa estaria na disputa política municipal, quando os liberais revoltados porque os conservadores, sob a liderança do Vigário, intentavam golpe eleitoral nas eleições de 1880.
O Padre Iorio, membro do Partido Conservador, tornara-se alvo dos liberais. Na véspera da eleição municipal de 1880, "No dia 29, quando o povo se achava na igreja, ouvindo a missa conventual, entrou o coronel Francisco Dias Baptista, acompanhado de quarenta e cinco capangas todos armados, trazendo dois delles bandeiras vermelhas, marchando á dois de fundo, com as armas em punho e bandeiras desfraldadas; rodearam a egreja e desfilaram pelas ruas da villa (...)." (Correio Paulistano, 15/07/1880: 1).
Vitoriosos, os liberais cuidaram em logo desmoralizar o padre e hostilizar os conservadores, iniciando a nova matriz – construção assumida pela Câmara Municipal, para obra cara, sem qualquer beleza arquitetônica e criticada pela população.
Iorio permaneceu à frente dos trabalhos até 12 de dezembro de 1882 sem qualquer interesse em concluir a nova Matriz.
A última referência santa-cruzense sobre o Reverendo Iorio diz que ele não votou nas eleições provinciais de 1883, por transferência de domicílio (ALESP, PO 83.110.2) no ano anterior.

—Padre Bartholomeu Comenale 
Após Iorio, o Padre Bartholomeu Comenale assumiu o vicariato santa-cruzense, por ato do Bispado de São Paulo publicado aos 09 de agosto de 1883, assumindo aos 17 dos mesmos mês e ano.
Comenale era italiano e naturalizou-se brasileiro, nos tempos em que resida em Santa Cruz. Durante o período em que esteve à frente da paróquia, como vigário forâneo, também foi fazendeiro – no Bairro da Serrinha, e político – Vereador / Presidente da Câmara, além de Presidente do Conselho da Intendência Municipal, de acordo com ato publicado em Diário Oficial de São Paulo, de 10 de maio de 1892.
Coube a Comenale apelar à Câmara Municipal para requerer do Governo Provincial a instituição de imposto anual obrigatório a todos os munícipes, emancipados e alforriados, a favor da igreja até que esta estivesse pronta e aparamentada.
O Governo atendeu a solicitação. Na data de 20 de agosto de 1884 a Câmara Municipal registrou entrada da Resolução Provincial nº 8, de 14 de março de 1884, quanto à contribuição obrigatória dos munícipes para o término da construção da Igreja Matriz, e então o Presidente determinou extração de cópia e a enviou ao Delegado de Polícia local determinando o cumprimento da ordem dada, através dos Inspetores de Quarteirões.
Em 12 de novembro de 1884 a Câmara indicou ao Governo Provincial uma comissão de idôneos: Padre Bartholomeu Comenale, Joaquim Manoel de Andrade e mais o Tenente-Coronel Emygdio José da Piedade para acompanhamento das obras e gerir os recursos destinados à construção da Igreja Matriz.
A medida legal, em forma de imposto, foi decisão política bastante impopular e ineficaz.
O padre demonstrou ser administrativamente desorganizado, causando confusões no livro do Tombo, retirando e acrescentando assentos. No livro eclesial de registros de óbitos – Volume I, para o período de 1883 a 1897, por ele transcrito, as anotações para 1891 desapareceram, a partir de 28 de janeiro, folhas 41 – verso, sob o número 17, para em seguida constar o de número 18 com data inserida de 04 de dezembro de 1888, enquanto o de número 19 refere-se a 31 de janeiro de 1896, já com assinatura do Padre Paschoal Maria Giffoni.
Como político igualmente mostrou-se desarranjado e suspeito em sumir com acervo bibliotecário municipal. As displicências de Comenale trouxeram prejuízos à história de Santa Cruz do Rio Pardo, quando o Estado e a Igreja interpenetravam-se juridicamente.
Comenale não concluiu o templo religioso, e deixou a paróquia aos 09 de janeiro de 1895.

—Monsenhor João Soares de Amaral
Monsenhor Soares do Amaral chegou ao lugar aos 21 de abril de 1895.
Pouco tempo à frente da Igreja, Soares do Amaral teve por destaque maior criticar o seu antecessor porque deixou a "Parochia em um estado verdadeiramente lastimavel, debaixo de todos os pontos de vista (...). A Egreja pauperrima de paramentos e alfaias, reinando a maior desordem e confusão no livro do Tombo e na Fabrica, estando esta com um grande deficit e com a escripturação toda por fazer-se."
Lamurioso com os rumos do catolicismo diante do laicismo brasileiro, e o desinteresse local com a espiritualidade, o Monsenhor teria desabafado, "Não encontrei uma devoção qualquer de modo que a religião deste povo, cifrava-se em baptisar seus filhos.(...). Nas Parochias do Espirito Santo, São Domingos, Capellas do Oleo, Lageado e Ilha Grande, pertencentes a esta Parochia, o mesmo espirito, o mesmo indifferentismo religioso."
O velho sacerdote preocupava-se com o avanço presbiteriano – os protestantes, e a isto aliado a extensão da paróquia fez o alerta: "Santa Cruz precisa de um Parocho moço, prudente e zeloso, que, com seus esforços, cooperados pelo influxo da graça, deverá chamar ao redil já muitas ovelhas que se dizem crentes ou protestantes."
Decepcionado, o Monsenhor deixou a Vigararia aos 30 de novembro de 1895, aparentemente sem se importar com as obras da matriz, e as citações acima são a ele atribuídas (Correio do Sertão, 21/02/1903: 1, homenagem póstuma).

—Padre Paschoal Maria Giffoni
Em lugar do Monsenhor Soares chegou o Padre Paschoal Maria Giffoni, aos 19 de janeiro de 1896, para enfrentar a apatia religiosa da população.
Não lhe foi demérito algum. Desde o Padre Figueira nenhum outro conseguira sensibilizar a população para a construção da Matriz, além de sentir-se no desconforto em reunir os fiéis na antiga edificação cercada pelos paredões, e as adaptações feitas ano a ano, sem a conclusão da obra.
Deixou Santa Cruz no final do ano de 1900, para retornar quase quatro décadas depois, onde faleceu aos 29 de junho de 1937, quando a vigararia sob o controle dos padres dominicanos, desde 10 de setembro de 1936.

—Cônego João Antonio da Costa Bueno
Após Giffonni assumiu o Cônego João Antonio da Costa Bueno, em 02 de dezembro de 1900, no encerrar do século XIX.
Costa Bueno pretendeu a construção de outra igreja, uma obra grandiosa em lugar da malfadada matriz inconclusa. "Era intenção do Revmo Cônego João Antonio da Costa Bueno, intenção que teve seu começo de execução, como diriam os criminalistas, edificar a igreja matriz nesta Praça, conforme se vê nas escavações para os alicerces da igreja, a qual ficara com a frente para a Travessa de Manoel Herculano, com o fundo para a rua que passa em frente das casas do Dr. Cleophano Pitaguary e Major Arlindo Piedade de modo a cortar o corpo da igreja velha, e fazer com esta um ângulo quase recto." (Correio do Sertão, 19/04/1902: 1).
A nova matriz, no início do século XX, não sairia conforme suas pretensões.

11.5. Subdelegacia de Freguesia
Documento da Secretaria de Polícia da Província de São Paulo, datado de 15/01/1873, Divisão Policial, informava: "No anno passado [1872] creou-se a Delegacia de S. José dos Barreiros, bem como as Subdelegacias das novas Freguezias de (...) Santa Cruz do Rio-Pardo." (RG, BN 1014, 1873/1873: A-17).
Segundo informações foram nomeadas autoridades policiais em 1872, Francisco de Paula Martins, Luiz Antonio Rodrigues e Fortunato Rodrigues da Costa (Correio do Sertão, 19/07/1902: 2-3).
Improcede. A reportagem do Correio do Sertão equivocou-se, com certeza, sendo as mencionadas autoridades nomeadas em 1876, quando Santa Cruz – Vila, e não como constou.
De outra forma, não foram encontrados documentos que pudessem comprovar referidas nomeações, resgatando, porém, informativo de 1873 que corrige o erro histórico: "FREGUEZIA DE SANTA CRUZ DO RIO-PARDO – Foi creada Freguezia por lei de 20 de Abril de 1872, sendo nomeadas as primeiras autoridades em Dezembro do mesmo anno*. SUBDELEGADO *Claudino José Marques. Supplentes 1º, Capitão Joaquim Compton D’E1boux. 2º, João Bonifácio Figueira. 3º. Siryno Carneiro de Araujo." (Almanach da Provincia de São Paulo, 1873: 448-A).
O Capitão Joaquim Compton D’Elboux, foi herói na Guerra com o Paraguai (Della Rosa - Ricardo R_32, 2011: 16/03), e veio residir na região santacruzense, além de possuir casa comercial em São Pedro do Turvo (Almanach da Provincia de São Paulo, 1873: 448-B).
Preenchidos os requisitos, Santa Cruz recebeu engajamento de praças [soldados], de acordo com o Relatório de Governo e seu nome lançado no Mapa [dos Quadros] da Policia em 05 de fevereiro de 1873 (RG, BN 1014, 1873/1873: M-23).
Para subdelegacia de freguesia o governo provincial assumia as responsabilidades pelo aluguel ou construção de um prédio próprio para instalação e funcionamento do quartel e cadeia. O Deputado Emygdio José da Piedade apresentou projeto nesse sentido.
Segundo Piedade, desde janeiro de 1875 o governo provincial tomou as responsabilidades com as despesas de imóvel, de propriedade de Valentim José Theodoro, que servia de quartel e cadeia para Santa Cruz do Rio Pardo (Correio Paulistano, 12/04/1882 Suplemento de 19/03/1882: 1).
O deputado descreveu aquele imóvel que servia de quartel e cadeia, "uma pequena casa, feita de pau-a-pique (...) uma casa que não se presta ao fim que é destinada, casa que até hoje não tem recebido o menor concerto." (Correio Paulistano, 08/03/1882: 2). O aluguel não era barato diante daquilo que se apresentava.
Sem méritos onde a localização daquela cadeia e quartel, ou se lá o primeiro imóvel policial, Valentim José Theodoro, homem do comércio, era dono de imóveis no pontal São Domingos/Pardo, margens às direitas e divisas com o patrimônio de Santo Antonio – atual Bairro São José (Cartório de Registro de Imóveis, Escritura de 05/02/1903, Livro 3 L (antigo), fls. 26-sgs). Valentim também possuía olaria à margem do Pardo, acessada pela atual Rua Duque de Caxias.

11.6. Tabelionato de Paz
Santa Cruz, na condição de freguesia, teria competência para nela ser instalado o Tabelionato de Paz, ou Cartório Notarial com o mesmo significado, por delegação do Poder Público, para formalizar juridicamente os assentamentos de terras ou situações negociadas, a que as partes pretendam dar forma legal e autenticidade, dando-lhes redação e instrumentalização própria, com objetivos de formalidades para a validade do ato em si mesmo, para garantir sua eficácia perante terceiros, conservando os originais e expedindo cópias fidedignas de seu conteúdo e autenticar fatos.
Um cartório, resguardadas amplitudes de outras informações e considerando referência ao século XIX, funcionava com pelo menos um escrivão de paz e o tabelião, não raras vezes, ilegalmente, o escrivão em exercício cumulativo. Ao escrivão era dada competência de escrever ou registrar atos em livro de padrões e títulos autênticos de onde constem as ações e direitos, mas ao tabelião cabia atribuição para titularizar, reconhecer assinaturas e autentica documentos, sem prejuízos de outras prerrogativas legais.
A ausência de documentos quanto à instalação do Tabelionato em Santa Cruz não permite apontar data correta, ou mesmo se o feito teria acontecido nos tempos de freguesia ou de vila.
No entanto, é possível alcançar com segurança absoluta, o ano de 1876, quando Jacob Antonio Molitor, "Tabelião de Paz da Freguesia de Santa Cruz do Rio Pardo" lavrou escritura de compra e venda de terras – Fazenda Pari-Veado (Cobra, 1923: 62-63).
A partir do referido ano é possível localizar documentos lavrados em Santa Cruz do Rio Pardo, no Tabelionato de Paz, sendo comuns os nomes dos funcionários Antonio Jacob Molitor, Tabelião de Paz; José Manoel de Almeida, Escrivão; e Luiz Domiciano Rosa ou Domiciano Luiz Rosa, Agente Público.
Estes nomes estão conluiados a Manoel Joaquim Bueno, nos grandes grilos de terras, dando autenticidade aos documentos, retroagindo datas entre os anos de 1856 a 1864, inclusive com lançamentos em livros próprios, que consistia em fazer duplicata acrescendo os assentamentos desejados, algo trabalhoso, porém serviço vendido a altos preços.

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