quinta-feira, 7 de junho de 2012

21. Nomes que marcaram época no século XIX

Os nomes aqui apartados por livre escolhimento, portanto discutíveis, obedeceram a critérios de participações sociais e políticas na história local apenas para o século XIX, por isso a ausência de Antonio Evangelista da Silva, o Coronel Tonico Lista, o mais famoso nome da história de Santa Cruz do Rio Pardo, cuja trajetória somente ocorreria no século XX.
É certo que Antonio Evangelista da Silva assassinou dois policiais em junho de 1892, mas o crime não teve nenhuma conotação com o futuro Coronel Tonico Lista, nome maior no século XX.

21.1. Coronel Emygdio José da Piedade
A história local ficaria incompleta sem a sua participação, como político realizador de expressão maior, onde outros nomes consagrados, como Joaquim Manoel de Andrade, lhe foram apenas coadjutores.
Para o Almanaque da Província de São Paulo, edição de 1888, Santa Cruz do Rio Pardo "Creado o municipio em 1876, tem desde então para cá prosperado admiravelmente sob a immediata proteção e direção do notavel paulista Exmo. Sr. Coronel Emygdio José da Piedade, illustrado representante deste 5º districto na Assembléa Provincial." (Almanach da Província de São Paulo (...) 1888: 623).
Emygdio José Piedade nasceu em Sorocaba (SP), no ano de 1831, filho do Capitão José Antonio da Piedade e de dona Rita Maria da Conceição, casado aos 21 de abril de 1853 com a itapetiningana Francisca Emilia Leonel Ferreira, ela nascida por volta de 1833, filha do Tenente Coronel José Leonel Ferreira e dona Maria Perpétua de Siqueira.
Inteligente e culto, Emygdio estudou Teologia Dogmática e Moral em São Paulo – Capital, e lecionou Latim (Aluízio de Almeida, Abril/Junho 1960: 52 – Volume 247: 2-65). Envolvido em política, filiou-se ao Partido Conservador, sendo candidato e eleito para a Assembleia Legislativa Provincial de São Paulo, na 18ª. Legislatura 1870/1871, 3º Distrito – Imperial (ALESP - Deputados do Império).
Nessa primeira legislatura foi escolhido Membro da Comissão de Câmaras Municipais, com realizações para São Sebastião do Tijuco Preto – Piraju, Lavrinhas, Ribeira e São João Batista do Rio Verde – atual Itaporanga, Faxina – hoje Itapeva, além de comprometido nas aberturas de escolas, de estradas para diversas povoações em formação, incluso território de Santa Cruz do Rio Pardo, cuja localidade elevada a freguesia em 1872.
Disputou e elegeu-se para a 20ª. Legislatura 1874/1875, 3º Distrito – Imperial (ALESP - Deputados do Império).
Ser Deputado, na época, não era tarefa fácil, mas adaptava-se à condições e durante seis meses permanecia na Capital, e os meses restantes do ano ficava em recesso, geralmente no Distrito – sua cidade ou região, pelo qual eleito, inclusive a preencher outros cargos públicos, nem todos remunerados, sujeito a convocação extraordinária da Assembleia.
Emygdio foi um grande paulista. Aluizio de Almeida fornece a exata dimensão da grandeza do Deputado, no capitulo Um Coronel na Região – Cronologia Paulista: 52: 56 (O Vale do Paranapanema, Volume 247. Abril/Junho de 1960) como o primeiro deputado do centro sudoeste paulista, e suas atuações parlamentares para toda a região, em especial para Santa Cruz do Rio Pardo.
De 1876 a 1880 encontrou-se hiato na carreira do Deputado, tempo dedicado às atividades particulares e aos cuidados com Santa Cruz do Rio Pardo, localidade onde passara a residir e para a qual tanto desempenhou esforços políticos quanto sua efetivação como Freguesia e Vila. Com a emancipação político-administrativa do lugar, a exigir-lhe a presença em empregos públicos implantados, Emygdio também foi organizador do Partido Conservador local, e repassador de experiências e condutas políticas.
Sem ressentimentos manifestos, Emygdio perdeu as duas primeiras eleições municipais em Santa Cruz, quando viu triunfar o Partido Liberal.
Com a elevação de Santa Cruz a Termo de Comarca, Emygdio fez-se o primeiro suplente do Juiz Municipal e de Órfãos, e Juiz de Paz em 1880, esta por eleição.
Restabelecidas as regras para eleição direta à Assembleia Provincial, disputou o pleito de 1881, pelo Partido Conservador, 5º Distrito de Botucatu inclusa a área santa-cruzense.
Disse aos potenciais votantes: "Entrego minha candidatura ao criterio do respeitavel eleitorado do districto, o qual, aceitando a ou repelindo a, convencer-me ha de minha capacidade ou incapacidade. Tranquillo aguardo o dia da decisão."(Correio Paulistano, 1º/09/1881: 2).
Desta eleição escreveu Queiroz Filho: "Em 4-11-1881 (cfr Livro de Atas da Câmara Municipal) disputavam a eleição municipal um Tenente-Coronel (Emigdio José da Piedade), um Capitão (Tito Corrêa de Melo) e um Coronel (Joaquim Leonel Ferreira), tendo vencido o primeiro." (Queiroz Filho, 1966: 205 - notas 17). O pleito era provincial e Emygdio foi o mais votado na paróquia de Santa Cruz do Rio Pardo, e, assim, eleito para a 24ª. Legislatura 1882/1883, 5º Distrito – Imperial e sua atuação considerada brilhante, bastante elogiada pelo Correio Paulistano.
A despeito das realizações a favor do 5º Distrito, em especial para Santa Cruz, enfrentou séria oposição dentro do próprio Partido Conservador, acusado por Jacob Antonio Molitor de envolvimentos escusos com o Partido Liberal (Correio Paulistano, 21/06/1883: 3). Teve dificuldades em reeleger-se, no pleito de 1883 – legislatura 1884/1885.
Contra Emygdio levantara-se Jacob Antonio Molitor, com pressuposto envolvimento de Joaquim Manoel de Andrade, que logo tratou em desmentir: "Chegou ao meu conhecimento que alguns despeitados, e outros egoistas enciumados, pretendendo a derrota do distincto candidato o tenente-coronel Emygdio José da Piedade na proxima eleição provincial de 15 de Outubro deste anno, se têm servido do meu nome, como arma de guerra contra o mesmo, espalhando não só na capital com em muitas parochias do 5º districto o boato de que este candidato não encontra apoio em lugar algum do districto, e que, nem mesmo nesta villa, onde móra, tem votação, porque achando-se brigado comigo eu não lhe darei voto algum."
E Andrade hipotecou solidariedade política e de amizade: "apresso-me á declarar que acho-me na mais perfeita intimidade de relações de verdadeira amizade com o tenente-coronel Emygdio Piedade, à cuja reeleição auxiliarei com meu voto, de meus filhos e genros e daquelles amigos que até hoje tem seguido meus passos na vida politica, e por elle farei o que o dever de amizade e de gratidão me impõe." (Correio Paulistano, 09/07/1883: 2).
Molitor não sossegou e acusou Emygdio de apropriação indevida de uma novilha. Mais grave ainda, incriminou-o de ter facilitado fugas de presos da cadeia local.
Molitor era o Delegado de Polícia e abriu inquéritos, causou danos, mas Emygdio conseguiu a reeleição, para a 25ª Legislatura, de 1884/1885, com votos aquém do esperado em Santa Cruz, mas eleito com o apoio do itapetiningano Manoel Cardoso (Correio Paulistano, 03/10/1883: 3).
Assumiu cadeira aos 04 de janeiro de 1884, ocupando a mesa como 1º Secretário, e nessa legislatura conquistou aprovações para Comarcas em diversas localidades, entre elas Santa Cruz do Rio Pardo (ALESP, Deputados do Império, Parlamentos Império e República Velha e feitos e realizações como parlamentar).
Não pacificou os conservadores rebeldes da Paróquia de Santa Cruz do Rio Pardo, 5º Distrito, doravante necessitando cada vez mais de votos de fora para prosseguir na carreira política.
Candidato em 1885 – 26ª legislatura, 1886/1887, não teve seu nome no rol dos elegidos, o que o levou recorrer a recontagens de votos, inclusive de adversários dos quais suspeitava de fraudes, e conseguiu uma vaga na Assembleia.
Em 1887 a eleição lhe pareceu mais tranquila, buscou novos eleitorados, para conquistar votos suficientes para a 27ª legislatura, 1888/1889. Interromperia carreira política entre 1889 a 1895, porém retornaria vitorioso, segundo expedientes ALESP, para as legislaturas 1901/1903 e 1904/1906.
 presença de Emygdio em Santa Cruz e seus afazeres públicos podem ser documentalmente acompanhados:
-Agente Postal em 1876 (Aluízio de Almeida, abril / junho de 1960: 53 - Volume 247: 3-65).
-Juiz de Paz reeleito em 1882, porém cancelada a eleição novamente candidatou-se, em outubro de 1882, com a vitória confirmada.
-Membro da Comissão de Ilustres de Santa Cruz do Rio Pardo, "por sua dedicação aos negócios da igreja, por seu caráter ilibado e por todos os títulos que recomendão estão nas condições de bem desempenhar." (Câmara, Livro de Ofícios Expedidos e Recebidos, exercício de 1884).
-Tenente Coronel do 5º Distrito de Botucatu / Regional - Guarda Nacional: Comandante nos anos de 1884, 1885/1886 (Documentos Referenciais para a Guarda Nacional).
-Coronel Comandante Superior da Guarda Nacional de Botucatu e Lençóes, pelo Decreto de 20 de outubro de 1888 (RG, BN 1033 – 1888: 26).
-Presidente da Câmara Municipal em 1889: quando anunciado o Golpe Militar de 1889 que derrubou o Império (Câmara, Ata da sessão de 21/11/1889).
-Juiz não Togado: Ocupou a função de Juiz Municiap em Santa Cruz até entrada em vigor do Decreto nº 114, de 03 de janeiro de 1890 (RG, U 1145, 1890: 11).
Emygdio foi a extensão política santacruzense, onde tinha interesses desde 1876 quando se mudou para o lugar (Aluízio de Almeida, Abril / Junho 1960: 53 – Volume 247: 2-65). 
Fazendeiro na região de Espírito Santo do Turvo, em 1881 adquiriu terras de Francisco de Paula Moraes, no Vale do Rio do Peixe, sabidamente não legalizadas. Emygdio comprara a Fazenda Pomba do Futuro, enquanto o filho Augusto César [Cezar] da Piedade a Pomba de Prata (Nogueira Cobra, 1923: 71).
O Coronel Emygdio José da Piedade teve autorização legal para ser sepultado, juntamente com a esposa, na Igreja Matriz de Santa Cruz do Rio Pardo (Lei nº 83, de 01 de abril de 1889). Declinou da concessão para a esposa e para si.
Eleitor em Santa Cruz do Rio Pardo, conforme Alistamento eleitoral de 1890, que lhe indica a profissão de negociante, tinha residência na rua identificada com seu nome – Rua do Coronel Piedade, oficializada posteriormente como Rua Coronel Emygdio José da Piedade, até dos dias atuais.
Em março de 1891 transferiu endereço para São Paulo e seu nome aparece em vários documentos oficiais como político em exercício, ou como agregado à Guarda Nacional, no Comando Superior em 1893, conjuntamente à frente dos paulistas na Revolução Federalista de 1892/1893, na qual teve seu nome envolvido em desvio de recursos públicos, juntamente com o Coronel Francisco Sanches de Figueiredo, de Campos Novos Paulista, ou por este insinuado.
Residente em São Paulo disputou eleições pelo 5º Distrito, foi eleito Deputado Estadual para a Legislatura 1895/1897; com reeleição para a Legislatura 1898/1900, 5º Distrito - República Velha. Ainda se manteria político até 1906.
Em 1896 foi Procurador do Gabinete de Leitura da Faxina (DOSP, 20/02/1896: 2) de fevereiro de 1896), e também eleito Membro para a Comissão de Colonização e Imigração para o Estado de São Paulo, sessão ordinária de 11 de junho de 1896, do Congresso do Estado - Câmara dos Deputados (DOSP, 12/06/1896: 7).
Emygdio foi casado com Francisca Emilia Ferreira Leonel “dos Leonéis de Itapetininga, era tia do General Ataliba Leonel” (Aluízio de Almeida, Abril / Junho de 1960: 56 - Volume 247 - 3-65). Enviuvou-se em 1900.
O casal teve os seguintes filhos, não necessariamente em ordem cronológica:
-Augusto César da Piedade - Coronel, casado com Dona Cândida Macedo da Piedade;
-Minervina da Piedade, casada com o Coronel João Batista de Oliveira Melo;
-Acácio da Piedade - Coronel, casado com Dona Leocádia de Mello Piedade, ou Dona Leocádia Bueno Pimentel, conforme também conhecida;
-Arlindo Crescencio da Piedade - Coronel, casado com Dona Hermínia Romano (falecida em 23 de junho de 1902), e mais outros dois matrimônios conhecidos;
-Godofredo José da Piedade, faleceu solteiro.
-Rosalina da Piedade que foi casada com o Coronel Emygdio [José] Dias de Almeida;
-José Brasil Paulista da Piedade, casado com Dona Maria Ramos;
-Albertina da Piedade, casada com o Major Ernesto Trindade;
-Dona Maria Perpétua da Piedade, casada com Francisco Clementino Gonçalves da Silva, Coronel, também identificado por Clementino Gonçalves da Silva;
-Emygdio [José] da Piedade Filho, Major, casado.
-Maria da Conceição Piedade, apelidada Sancha, que foi casada com Francisco Antonio Pucci.
Em Certidão de Óbito de Emygdio, de 30 de março de 1910, constou, entre os filhos, "uma neta de nome Alzira filha de sua filha de nome Minervina" (Certidão de Óbito nº 37, Livro C-3, fls. 144, Registro Civil das Pessoas Naturais - Espírito Santo do Turvo), com ausências dos nomes da própria Minervina e Godofredo. Também no Registro Civil não estão identificados de genros e noras, colhidos pelo autor em outras pesquisas (Aluízio de Almeida, Abril / Junho 1960: 55-56 – Volume 247: 2-65).

21.2. Joaquim Manoel de Andrade
Quando da qualificação administrativa de governo para Santa Cruz do Rio Pardo, como Freguesia, o nome de Joaquim Manoel de Andrade destacou-se dentre os demais fazendeiros da região para firmar-se líder, e seu nome a ilustrar os principais cargos da vida pública local. A história identifica-o respeitável cidadão, religioso prestante, riquíssimo fazendeiro, dono de serraria e escravagista.
Joaquim Manoel de Andrade nasceu em Pouso Alegre – MG, no ano de 1825, de acordo com sua qualificação em inquérito policial, como testemunha, aos 15 de maio de 1884, idade de "cincoenta e nove annos (...)." (Correio Paulistano, 11/06/1884: 3).
Registro batismal – Pouso Alegre, de 20 de novembro de 1825, revela-o nascido aos 12 de novembro daquele ano, filho de João Bernardino da Silveira. Por erro de anotação sua mãe, Bernardina Jesuina de Santa Catarina, não aparece naquele documento eclesial, no entanto mencionada na pesquisa de Paola Dias, Projeto Compartilhar, Cap. 4º – Ângela Pires de Moraes: 9.8 (Apud Leite Barbosa, em colaboração).
Joaquim teve pelo menos um irmão conhecido no sertão, Manoel Joaquim de Andrade, com participação histórica na região de Lençóis Paulista, enquanto Joaquim apresentou-se em São Domingos. Ambos surgem associados, possivelmente, numa transação de terras na região são-dominguense, no mês de dezembro de 1851 (Pupo & Ciaccia, 2005: 136 – E 30). 
Após 1870, Joaquim iniciou sua história em Santa Cruz, como rico fazendeiro, conhecido primo-irmão do homônimo pioneiro no Turvo, e de José Theodoro de Souza, sendo irmãs as mães dos três, respectivamente Bernardina Jesuína de Santa Catarina, Mariana Rosa da Assunção e Maria Teodora do Espírito Santo. O parentesco acha-se comprovado no Projeto Compartilhar (Família: Bernarda Maria de Almeida, apud Leite Barbosa).
Andrade tornou-se um dos principais nomes para a história santacruzense, de 1870 a 1891, ao lado de Emygdio José da Piedade, ambos consagrados pelas tradições como líderes para a elevação de Santa Cruz à condição de freguesia (1873) e depois a Vila (1876).
Partícipe da história santa-cruzense, elegeu-se vereador em 1876 na primeira legislatura (1877-1880), consagrando-se como o primeiro Presidente da Câmara, sendo reeleito vereador em outras oportunidades. Também foi eleito Juiz de Paz, em 1876, acumulando funções com a presidência camarária, detendo os dois maiores poderes da localidade num só tempo.
Respondeu por cargos púbicos em nomeação; em 1879 como Coletor de Rendas e, em 1890, designado Presidente do Conselho da Intendência Municipal, certamente o seu ápice político.
Integrou o 'Rol de Ilustres', indicado para compor a comissão responsável pelas obras da igreja matriz, juntamente com o Padre Bartholomeu Comenale e o Deputado Provincial Emygdio Jose da Piedade, "por sua dedicação aos negócios da igreja, por seu caráter ilibado e por todos os títulos que recomendão estão nas condições de bem desempenhar." (Câmara, Ofício Expedidos: 12 de novembro de 1884, quando mais uma vez Vereador – 1884-1886).
Casado com Dona Umbelina Maria de Jesus, teve os seguintes filhos conhecidos na história santa-cruzense:
-Manoel (Batismo: Botucatu, 30 de julho de 1853);
-Theodora (Batismo: Botucatu, 04 de setembro de 1858);
-Joaquim (Batismo: São Domingos, 05 de fevereiro de 1860);
-Antonio (Batismo: São Domingos, 01 de setembro de 1861);
-João (Alistamento Eleitoral: SCR. Pardo, 1890, nascimento 1862);
-Silvestre (Matrimônio: SCR. Pardo, 31 de outubro de 1891, nascido por volta de 1868);
-Pedro (Alistamento Eleitoral: SCR. Pardo, 1891, nascimento 1869);
-Benedito (Batismo: SCR. Pardo, 26 de janeiro de 1873);
-Thereza (Batismo, livro transcrito: SCR Pardo, nascimento 1875). Andrade faleceu aos 26 de dezembro de 1891, idade de 66 anos, em plena atividade política como Presidente da Intendência do Município, e seus despojos acham-se sepultados na Igreja Matriz São Sebastião (Livro do Tombo - Paróquia de Santa Cruz do Rio Pardo), juntamente com os de sua mulher Umbelina Maria de Jesus, morta em 09 de agosto de 1896 (Certidão de Óbito nº 942 – Registro Cartório Civil de Santa Cruz do Rio Pardo).
Numa referência póstuma a Joaquim Manoel de Andrade, o Correio do Sertão, de 19 de julho de 1902, citou-o "o ancião a quem a população muito deve, pelo seu trabalho a favor do desenvolvimento santacruzense, elevando o lugar à condição de freguesia e depois Villa." Agropecuarista e criador de porcos, Andrade também foi lembrado como "o fazendeiro mais abastado do município."
Joaquim Manoel de Andrade não foi o fundador da povoação inicial de Santa Cruz, mas sua participação na emancipação política do lugar deu-lhe destaques e as tradições colocam-no cofundador, ao lado de Manoel Francisco Soares.

21.3. Jacob Antonio Molitor
Antonio Jacob Molitor, de ascendência paterna alemã, surgiu na história santa-cruzense como Tabelião de Paz designado, em 1876, para tornar-se notório falsificador de títulos de terras e legalizações indevidas de propriedades, em todo o centro sudoeste paulista, para as regiões do Paranapanema, inclusive o Pontal, além do Peixe e do Feio/Aguapei.
Pela especialidade apresentada, garantia dos documentos e importante relacionamento com autoridades diversas da Província e do Império, Molitor tornou-se aliado dos grandes proprietários e por eles protegido e disputado, e até conquistou patente de Capitão da Guarda Nacional.
Membro do Partido Conservador, em sua residência, aos 04 de junho de 1880, aconteceu a reorganização daquele Partido que saíra fragorosamente derrotado nas eleições municipais de 1876, e então se preparava para nova disputa com os liberais em julho de 1880.
Molitor, assim como os demais conservadores locais, era liderado pelo Deputado Provincial Coronel Emygdio José da Piedade, tendo por adversário comum o Coronel Francisco Dias Baptista.
Em 1882 Jacob Molitor era o 1º Suplente de Delegado em Santa Cruz, exercente do cargo como auxiliar do titular Eugenio de Oliveira Chrispim, e ambos efetuaram a prisão do "fascinora Modesto Pedro Claro, que muito se distinguiu neste termo, especialmente no barbaro assassinato do infeliz Pedro Fortunato, pelo que se acha pronunciado e tem de responder ao jury neste mesmo termo. Foragido de Cabo Verde, sua terra natal, onde é pronunciado em crime de ferimentos graves, havia-se homisiado neste termo, onde, não obstante ser por demais conhecido, exerceu o officio de official de justiça, sendo ate votado, pelos liberaes seus correligionarios para vereador da camara municipal!" (Correio Paulistano, 08/08/1882: 3).
Modesto Claro era membro do Partido Liberal e protegido do Capitão e Deputado Provincial, por Botucatu, Tito Correa de Mello. O Governo de São Paulo era liberal e Tito o seu representante 'carta branca' regional.
Em decorrência do episódio, o Delegado Oliveira Chrispim foi transferido, de pronto, enquanto Molitor exonerado, e para o seu lugar nomeado Lucio Dias Baptista, conforme Ato Oficial do Governo Provincial, publicado no Correio Paulistano, de 02 de agosto de 1882.
Magoado, talvez esperando alguma reação do Deputado Emygdio ou cumprimento de promessa eleitora, dois anos depois Molitor desentendeu-se com o Deputado, rompendo vínculos políticos e relações pessoais.
Molitor então se filiou no Partido Liberal, para ser atendido em seus interesses pessoais. Por publicação de 07 de fevereiro de 1884 "Foi nomeado o cidadão Jacob Antonio Molitor para o logar vago de delegado de policia da villa de Santa Cruz do Rio Pardo." (Correio Paulistano, 07/02/1884: 2). Pouco depois Molitor também seria nomeado Inspetor Literário (Correio Paulistano, 02/04/1884: 2).
Assumiu o cargo de Delegado de Polícia, mostrando-se agressivo e prevaricador contra a população, segundo denúncias, impondo constrangimentos a cidadãos conceituados.
Investiu contra a família Piedade.
Em 19 de abril de 1884 deu voz de prisão a dois filhos do Deputado Emygdio, defronte a residência deste, ação depois retirada a pedido de cidadãos e políticos presentes no local. Molitor teria, na oportunidade, destratado publicamente o Deputado e aqueles que o defendiam.
A autoridade ou posição do Deputado não meteu medos a Molitor, que abriu inquérito policial denunciando-o de roubar novilha de um fazendeiro e, mais grave, que Emygdio, através dos filhos, teria facilitado fuga de presos da cadeia. Afora o andamento processual na Delegacia, Molitor revelava em jornais da capital o envolvimento do Deputado Emygdio em negociatas partidárias.
Emygdio sentiu os golpes e destacou o filho Augusto para revidar, acusar e desqualificar Molitor. Augusto denunciou Molitor perante a Chefatura de Polícia e o Governo.
Surpreendido Molitor requereu exoneração dos cargos que detinha, de Delegado e Inspetor Literário, e o Governo da Província nomeou outro Delegado, o Alferes Hypolito da Graça Martins, por Ato de 06 de maio de 1884, e também nomearia Arlindo Crescêncio Piedade como Inspetor Literário (RG, U 1137, 1884/1885: 10).
Mas o Governo recuou, tornou sem efeito as nomeações e manteve Molitor em ambos os cargos, inicialmente por noventa dias para defender-se das acusações. O prazo, no entanto, seria estendido até o desfecho processual, sem nenhuma pressa do Governo.
Fortalecido, Molitor continuou rápido o jogo rasteiro, mas foi denunciado pela Câmara Municipal ao Governo da Província, através de Ofício de 1º de agosto de 1884, narrando fatos que dito delegado e o soldado ou cabo, João Mariano, cometeram práticas de atos hostis contra o Presidente do Legislativo, Vereador Luiz Antonio Rodrigues, contra o Secretário da Câmara, Augusto César da Piedade, e contra o Professor Godofredo Piedade, barrados todos grosseiramente quando em visitas às obras do prédio da Delegacia.
O Governo atendeu a reclamação apenas em parte, nomeando Sebastião Soares de Lima por Comandante da Polícia local, porém Molitor mantido no cargo.
A nomeação de Sebastião Soares Lima para o comando militar em Santa Cruz do Rio Pardo, tecnicamente anulou a força de Molitor que perdeu a voz de ordem sobre os policiais. Um abalo no prestígio de Delegado, e disto beneficiaram-se os conservadores, tanto que Augusto cessou suas denúncias pessoais ou em nome da família.
Nas eleições de 1884 Emygdio comunicou o Comando da Polícia que fora ameaçado de morte e haveria fraudes nas eleições, por parte dos liberais. Seria um estratagema para atrair a atenção policial sobre o pessoal de Tito e de Molitor, com liberdade para os conservadores agirem e ganharem as eleições.
Soares de Lima agiu rápido e evitou problemas em Santa Cruz, ou seja, colocara-se sob as ordens do adversário. Mas em São Pedro do Turvo ocorreram tumultos e danos eleitorais provocados por Tito através de jagunços.
As ações de Soares Lima não passariam incólumes, e as reações liberais não tardariam. O comandante do destacamento, foi exonerado do cargo e, em seu lugar nomeado João Antonio Molitor, irmão de Jacob Antonio Molitor, evidenciando prestigiado o delegado e a força regional do deputado botucatuense liberal, Capitão Tito Corrêa de Mello.
Era o que menos desejava o Partido Conservador, e as ondas de denúncias e calúnias recomeçaram. As novas denúncias calaram fundo. Augusto, pela família Piedade, sofreu testemunhado atentado, e mudou-se para São Paulo, para continuar sua tática de ataques ao Delegado Molitor, causando repercussão.
Em setembro de 1885, o Vice-Presidente da Província - em exercício do cargo de Presidente, atendeu a proposta do seu Chefe de Policia, em Ofício nº 150 de 10 de setembro de 1885, e exonerou, entre outras autoridades da província, Jacob Antonio Molitor e, depois, seu irmão João Antonio Molitor.
Santa Cruz fez festa e a banda podre da polícia foi revelada. Molitor e seu irmão cumpriam ordens de Tito e facilitaram fugas de presos de alta periculosidade, jagunços do capitão e até um preso removido da penitenciária de São Paulo para Santa Cruz.
Para a família Piedade a exoneração de Jacob Antonio Molitor foi alívio, mas o estrago político estava feito, e o patriarca Emygdio precisaria doravante contar com votos de outras localidades para eleger-se deputado.

21.4. Dr. Olympio Rodrigues Pimentel
Filho do Coronel Salvador Rodrigues Pimentel e Benedicta Monteiro dos Santos, Olympio Rodrigues Pimentel foi advogado brilhante, um dos mais respeitados no Brasil de sua época, com destaques nas questões e legalizações de terras.
Estava no exercício do cargo de Promotor Público no ano de 1891, na localidade de Silveiras, quando removido para Itapeva da Faxina (DOSP, 19/05/1891: 20), todavia rejeitou a resolução de governo, denunciando as elites instaladas no poder do governo paulista de Americo Brasiliense (Correio Paulistano, 26/05/1891: 1).
Convicto que sua remoção trazia motivos políticos sórdidos, esclareceria melhor numa outra denúncia onde informava: "Tal remoção equivale a minha demissão, porque sabiam perfeitamente os mandões locaes que a inspiraram, que eu daqui não sahia. Foram alum tanto cobardes; deviam aproveitar da culminante posição que occupam e impôr ao dr. Americo a minha demissão a bem do serviço publico." (Correio Paulistano, 26/05/1891: 2).
Demitiu-se e no ano de 1892, candidatou-se e foi eleito Deputado Estadual, por Silveiras - SP, conforme constou: "Eleição na Capital: A chapa recommendada nos suffragios do partido republicano desta capital para senadores e deputados ao Congresso do Estado, na eleição de 7 do corrente é a que em seguida publicamos: (...) para deputados: Dr. Olympio Rodrigues Pimentel - advogado, residente em Silveiras". (Correio Paulistano, 04/03/1892: 1).
O então Deputado quando no exercício das funções participou de estudos quanto às pendências de terras no Estado de São Paulo, das terras devolutas, das posses não determinadas e registros discutíveis.
Transferiu domicílio para Santa Cruz do Rio Pardo, aonde elegeu-se Vereador (1894-1896), porém sua preocupação maior, desde que deixou a deputação, estava em advogar a favor dos grandes fazendeiros interessados em demandar posses de terras, e tornou-se famoso nesta atividade e teve entre seus principais clientes, Coronel João Baptista Botelho, Dr. Francisco de Paula de Abreu Sodré, Balthazar de Abreu Sodré, João Evangelista de Souza e o filho deste, Antonio Evangelista da Silva - Coronel Tonico Lista, entre outros nomes importantes da época, inclusive em causa própria neste setor, de acordo com editais forenses, diários oficiais e jornais locais, até após a primeira vintena do século XX.
Para os irmãos Sodré, à frente de outros interessados, Pimentel regularizou situações de terras das Fazendas São Domingos, outrora de Manoel Francisco Soares, a Crissiumal - do mesmo Soares em comum com João Francisco dos Santos. A favor de Balthazar de Abreu Sodré, acertou documentações de parte da Fazenda da Onça.
Para si o advogado requereu a Fazenda que viria denominar Santa Aureliana – homenagem à esposa, e para Antonio Evangelista da Silva e família Lara a área que seria a futura Terra do Peixe, depois parte conhecida como Chácara Peixe, ambas desmembradas da Fazenda São Domingos.
Foi um dos maiores destaques políticos de Santa Cruz do Rio Pardo nos primeiros quinze anos do século XX, sendo o primeiro prefeito do lugar – com esse título, e mais uma vez Deputado Estadual.

21.5. Dr. Cleophano Pitguary de Araujo
Brilhante advogado, Cleophano Pitaguary de Araujo exerceu funções de Juiz Municipal e de Órfãos em Avaré, até o final de 1892, quando nomeado Promotor Público para a Comarca de Santa Cruz do Rio Pardo, pelo Decreto de 23 de dezembro de 1892 (DOSP, 25 de dezembro de 1892). Solicitou e teve concedida sua exoneração em 1894.
Em Santa Cruz residiu numa casa, depois demolida, cujo terreno doado, pelo então proprietário Plácido Lorenzetti [Lorenzeti], à Companhia de Maria.
Meteu-se na política local, candidato ao cargo de Vereador, em 1896, para a legislatura 1897-1899, não conseguindo eleger-se. Talvez não tenha se interessado ou empenhado por isto.
Pouco depois, pelo 5º Distrito, Cleophano viu-se candidato a Deputado Estadual, lançado pelo Partido Republicano Paulista, por influência da força jovem perrepista santa-cruzense, comandada pelo Tenente-coronel ou já Coronel João Baptista Botelho, e reeleito nas eleições de 1900, mandato de 1901 a 1903.
Político pouco conhecido em Santa Cruz tem feitos políticos maiores registrados no município de Ipaussu. Em Agudos existe a Avenida Cleophano Pitaguary, talvez em sua homenagem.
Casado com Dona Maria Melchior, de família itapetiningana, Dr. Cleophano Pitaguary destacou-se fazendeiro em Ipaussu, onde passou a residir já no século XX.
Cleophano teve pelo menos um irmão residente em Santa Cruz, o Capitão Antonio Sanches Pitaguary, estabelecido no ramo de farmácia.

21.6. Coronel João Baptista Botelho
O advento republicano fez acontecer o poderio do Coronel Marcello Gonçalves de Oliveira, prestigioso chefe político em 1894. Referência ao Coronel Gonçalves Oliveira em 1894 identifica-o como "republicano da velha guarda" (Correio Paulistano, 18/07/1894: 2), político eleito antes do golpe militar de 1889.
Algum acontecimento em Santa Cruz, ainda não conhecido ou revelado, afastou o Coronel Marcello do poder político e mesmo social. O seu nome não constou no cadastro de eleitores, para o ano de 1894/1895, e então eis líder o perrepista Tenente-coronel e depois Coronel João Baptista Botelho.
A ausência política de Marcello Gonçalves de Oliveira trouxe a Botelho a oportunidade em assumir a liderança do PRP, a partir de 1895. Se nos tempos da monarquia seu nome já aparecia filiado à Guarda Nacional, no novo regime sobressaiu-se "nomeado coronel comandante (...)" para Santa Cruz do Rio Pardo (Rios, 2004: 41) e, pouco depois, Comandante em toda a Comarca, acercando-se de leais amigos patenteados.
As revelações sobre Botelho para Santa Cruz do Rio Pardo tem pouca consistência histórica, ainda assim forjada pelo Correio do Sertão preocupado em criar mito identificado com o povo, em oposição a Sodré e Costa Junior. Botelho dito nascido em Lençóis Paulista, aos 27 de dezembro de 1856, segundo informação do Correio do Sertão (12/07/1902: 1) quando "por ali passavam seus pais vindos de Minas Gerais" (Junqueira, 2006: 62).
Baptista Botelho veio para a região acompanhando a família. Em 1873 seu pai João Botelho de Carvalho estava contado entre os ricos "fazendeiros de cana de assucar" em São Pedro do Turvo (Almanaque da Província de São Paulo (...) 1873: 448), onde residiam outros seus parentes e, tempo depois, Francisco Narciso ou Narcizo Gonçalves, seu futuro sogro, outrora comerciante em Espírito Santo da Fortaleza, atual território bauruense (Almanaque da Província de São Paulo (...) 1873: 447).
As revelações extinguem especulações de Rios, que Narciso seria empregado de Botelho em Ipaussu (2004: 52), e de Junqueira ao informar Botelho um menino pobre e trabalhador "como empregado da lavoura" (2006: 63). O Correio do Sertão, fonte comum para ambos, ensejava a imagem de Botelho um herói identificado com o povo, em oposição a Sodré e Costa Junior.
Botelho, fazendeiro, procurador e intermediário em compras e vendas de terras já em 1882 nomeado 2º Suplente de Delegado de Polícia (Correio Paulistano, 02/08/1882: 2); depois foi Membro da Comissão de Obras Públicas – construção da cadeia, por Ato Oficial de Governo (Correio Paulistano, 28/11/1883: 1); e Juiz Municipal, 1º Suplente em exercício (Correio Paulistano, 09 de maio de 1884: 2).
Também se meteu na política, membro do Partido Liberal em Santa Cruz (Correio Paulistano, 23/09/1884: 2), então chefiado por Jacob Antonio Molitor que disputava espaço político local com o conservador Emygdio José da Piedade.
Como liberal Botelho tirava proveitos do governo provincial, como suas nomeações para cargos públicos, por ser opositor político do próprio sogro e do Deputado Piedade.
A trajetória social-financeira de Botelho contou com grilagens de terras e avanços de divisas, quando no sertão "Havia larga margem para arbítrio na apreciação de cada caso e os legitimantes, por isso mesmo, ficavam à mercê do funccionário encarregado do serviço, sobretudo no ponto referente à cultura effectiva e morada habitual." (Cobra, 1923: 91).
Em Santa Cruz chegavam os "aventureiros agrimensores e legítimos donos das terras disputavam a posse delas, todos em busca da escritura legítima, oriundas das três grandes posses abertas por José Teodoro de Souza, no vale do Rio Pardo, Rio do Peixe e Paranapanema. No mais das vezes, estas disputas começavam nos fóruns das Comarcas recém-criadas e terminavam em terríveis tocaias, quando as sentenças finais vinham das descargas das espingardas e dos trabucos." (Rios 2004: 27).
Rios cometeu equívoco ou falha na revisão, pois onde se lê Rio do Peixe, leia-se Rio Turvo, porque Theodoro não avançou suas posses sobre aquele Vale.
Botelho era um líder, tipo resolvido, que "conviveu com muita gente atrasada, num lugarejo de aventureiros e bandidos. Soube lutar contra todo tipo de dificuldades, galgando destacada posição na sociedade santa-cruzense" (Junqueira, 2006: 63), quando o sertão exigia homem forte e destemido, não mais para conquistá-lo e sim chefiá-lo, capaz de enfrentamentos aos perigos, impiedoso com os inimigos e adversários, matá-los se preciso – atemorizá-los sempre, fazendo-se protetor e benevolente, ainda que exigente com aqueles que lhe eram subservientes e correligionários.
Botelho era um homem violento e acercava-se de capangas: "O Coronel Botelho commeteu erros, não ha duvida, mas seus erros tinham uma athenuante: è que elle sendo um homem sem instrucção, atrazado, nascido e creado no cabo do machado, não sabia cercar-se do melhor elemento para governar." (Correio do Sertão, 09/04/1903: 2, numa retrospectiva ao Coronel (1894/1901), em comparação a outro líder político mandatário (1902 ...).
Em torno de Botelho criaram-se lendas. Que a ele recorrera João Evangelista da Silva para proteção ao filho, Antonio Evangelista de Souza – o jovem Tonico Lista, que na noite de 10 de junho de 1892 assassinara dois policiais de São Paulo de passagem por Santa Cruz do Rio Pardo.
Não ocasião, revela Rios, o poder do Coronel mostrara-se contundente: "Ninguém aqui será preso enquanto estiver sob a proteção do Coronel João Batista Botelho" e em evidente menosprezo à autoridade policial: "Porque ao nosso delegado falta coragem para ir buscá-lo e a preguiça não lhe permite caminhadas longas." (Rios, 2004: 28).
Mas o Coronel Botelho era o delegado de polícia, por Ato de Nomeação do Governo de São Paulo (DOSP, 21 de maio de 1892), sendo o seu suplente, Luiz de Oliveira Martins, subdelegado nomeado pelo mesmo ato que tornara Botelho a autoridade policial. Botelho somente deixaria o cargo, a pedido, em agosto de 1894, substituído por Moyses Nelli (DOSP, 04 de agosto de 1894: 4).
O pai de Tonico Lista era fazendeiro, abastado, membro da Guarda Nacional e influente cidadão, além de companheiro político, republicano nomeado membro do Conselho Municipal de Intendência. Em verdade não houve interesse do Delegado de Polícia, Botelho, ou do seu imediato, Martins, prender Lista, que aguardaria o julgamento em liberdade.
Tonico Lista cometera os crimes em 10 de maio de 1892, fora denunciado no dia 04 de julho e pronunciado no dia 23 dos mesmos mês e ano, pelo Juiz Municipal Bernardino Antonio Pereira de Lima, com a confirmação pelo Juiz de Direito Augusto José da Costa, no dia 29 de julho, prisão em 31 de agosto e julgamento no dia 06 de setembro de 1892, com absolvição, em alegada legítima defesa, e não houve apelação (Rios, 2004: 28-29).
A presença de substitutos de Juiz ou Promotor no decorrer de algum processo era procedimento normal ante qualquer ausência do titular ou mesmo em auxílio a este. Não houve, portanto, nenhuma necessidade de força política no processo onde acusado, em 1892, o Tonico Lista.
Mas Botelho teve sim sua força política na condução do PRP santacruzense e viu eleito Deputado Estadual, pelo 5º Distrito, o advogado Cleophano Pitaguary de Araujo.
Apesar da atuação política demonstrada e ter colaborado na condução de Campos Salles à Presidência do Brasil (1898/1902), a eleição presidencial serviu mais aos interesses do Dr. Antonio José da Costa Junior, fazendeiro, advogado, político e amigo do Presidente eleito e empossado
Talvez isto não tenha afetado de imediato o poder de Botelho, todavia sua hegemonia política em breve seria contestada, com a presença de letrados capitalistas compradores de terras na região para as lavouras de café, escolhendo as melhores localidades e onde iriam passar os trilhos da estrada de ferro.
A ambição do Dr. Costa Junior na liderança política local consolidou-se com a chegada de Rodrigues Alves ao governo de São Paulo, em 1900, em detrimento aos interesses do Coronel Botelho, apeado do poder no ano seguinte e suicida em 1902, em meio a uma onda de boatos, desde traição conjugal à quebra financeira na crise do café, ou todos estes fenômenos conjugados.
Botelho, fazendeiro com mais de 100 mil alqueires de terras (R-SNA (...) – Quadro Demonstrativo, 1902: 98-161), nos últimos anos de vida, entre 1900/1902, dissipara muitos de seus bens.
Deixou viúva Dona Guilhermina Brandina da Conceição, com quem teve um casal de filhos, Maria e Benedito, sendo Benedito falecido nos primeiros dias de vida, enquanto de Maria nenhum registro de óbito localizado até o falecimento do pai, mas certamente morta, pois na declaração de morte de Botelho consta que não deixara filho algum.

21.7. Rita Generoza de Andrade
Rita Generoza de Andrade nasceu em São Domingos, lugar ou sertão, em 1858 e batizada aos 15 de setembro de 1859, com idade de 13 meses "filha legítima de José Joaquim de Andrade e Anna Luiza de Jesus", sendo oficiante o Padre André Barra.
Rita era Andrade, neta de Joaquim Manoel de Andrade, 'o pioneiro do Turvo', e foi ela casada com J
A mãe de Rita era filha de José Rodrigues da Silva e Maria de Nazareth, casal mencionado entre as primeiras famílias no Turvo, para Espírito Santo do Turvo.
O seu sogro, Pedro Paulo Rodrigues, excluído homônimo, foi membro do Conselho Municipal de Intendência, em Santa Cruz do Rio Pardo, por nomeação publicada em Diário Oficial de São Paulo, edição de 10 de maio de 1892.
João Linhaes ou Linhares, o marido, trazia o apelido Emboava que à Rita foi transmitido, por isso a identificação Ritinha Emboava, mulher de pequena estatura, de muita fé e resignação.
Rita aos 10 de outubro de 1886 perdeu o marido, vitima de "sarna recolhida – morphea”, conforme assentos. Quatro anos depois, morria o filho Guilherme, de dezesseis anos, também de "morphea"; e em 1903 falecia o seu ultimo descendente conhecido, Antonio, idade aparente de trinta anos, "proveniente de morphea."[*].
Também ela foi contaminada, porém nunca maldisse a sorte, dizem, e nem se prostrou indefesa, antes juntou forças e uniu-se ao médico italiano Samuel Genuta, para os cuidados de outros doentes metidos numa incipiente gafaria.
Então, Rita Generoza de Andrade – a Ritinha Emboava, não simplesmente aconteceu na urbe santacruzense, numa época em que hansenianos eram escorraçados da cidade, perseguidos e presos pela polícia para confinamento compulsório.
Entender Rita, hanseniana desde 1890 e esmoler pelas ruas de Santa Cruz do Rio Pardo, nos anos de 1900, sem perturbação alguma, ou era o seu maior milagre realizado, ou tinha ela a proteção imposta pelos sobrenomes importantes na sociedade regional da época, e que perdurou por décadas.
Mas Rita Emboava jamais teria se socorrido ou identificado com os familiares poderosos, a partir de 1890, talvez a valer-se do anonimato piedoso para não constranger parentes coetanos, como evidencia maior de sua renúncia ao mundo, ou sua resignação, para melhor intimidade com Deus em quem tanto acreditava.
Rita Emboava, Sinhá ou Nhá Rita ou, simplesmente, Ritinha, foi agraciada no imaginário popular santa-cruzense, como hanseniana santa, mulher desistida em sua dor e sofrimento pela perda dos filhos e marido, acometidos da mesma moléstia, deformante.
Impossível evocar Sinhá Rita e sua santidade sem qualquer lembrança da enfermidade nela instalada e, ainda assim, sua caridade ao próximo. São elementos indissociáveis.
-o-
[*] Errada a informação que João Miguel Linhares ou Linhaes, "filho legitimo de Pedro Paulo Rodrigues e de dona Etelvina Maria de Jesus", faleceu conforme registro de óbito de 10 de outubro de 1886 (Eclesial, Santa Cruz do Rio Pardo), pois referido assento consta falecido uma criança de 4 meses, por nome João, filho do casal citado.

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