quinta-feira, 7 de junho de 2012

7. O bandeirismo sertanejo

Com ou sem convocação, Theodoro chegou a Botucatu em 1850, à frente de um verdadeiro exército, para ultimar entendimentos com o capitão Tito para o chão a ser tomado, a favor dos fazendeiros, e as suas posses.
O plano estava em exterminar índios e recuar sobreviventes, havendo-os, num território abrangente, em torno de 198 quilômetros de largueza por 260 de extensão, infestados de indígenas hostis. Os ataques foram fulminantes, apontando a execução de plano elaborado, como estratégia de guerra, com localizações exatas das tribos, suas mobilidades e o número de seus guerreiros.
Considerados os detalhes e a eficiência dos ataques, ousa-se que Theodoro teria disposto nas matas grupos de índios pacificados, tempos antes, para situar e dimensionar tribos alvos, detalhes dos usos e costumes, observações de acidentes geográficos, como estratégias necessárias para a distribuição de mercenários em frentes de combates e colunas de apoio, além do aporte de armas e munições.
A entrada de Theodoro no sertão foi traumática aos indígenas. Em 1862, o Diretor Geral dos Índios, José Joaquim Machado de Oliveira, manifestou-se oficialmente contra o pioneiro, denunciando-o matador de índios e acusando-o das mais terríveis atrocidades no massacre aos selvagens na conquista sertaneja. (ALESP – EE 64.22: 17-19).
As razias e dadas apavoravam os índios, apanhados de pasmos na indolência da madrugada, com tiros e incêndios, encurralados para a morte, os atacantes não lhes poupando as grávidas, cujos ventres rasgados, crianças com o crânio estourado a porrete, os infantes atirados ao alto e aparados em facas e punhais, enquanto os velhos barbarizados.
Marins relata assim os acontecimentos da conquista sertaneja de José Theodoro de Souza e seu bando (1985: 40-41), narrativa que se assemelha à de Cobra, quando das dadas praticadas pelo Coronel Francisco Sanches de Figueiredo (1923: 142-143). 
Texto duplicado ou não, para esta ou aquela personagem, José Theodoro de Souza era conhecido "sertanejo e matador de bugres"(Almanach da Provincia de São Paulo, 1888: 655). Chitto o descreve, com o bando, perseguidor e exterminador de tribos inteiras, "Armado de trabucos e enormes facões, foices e outras armas (...). Os silvícolas fugiam em debandada, deixando tudo a mercê dos invasores, inclusive cadáveres." (1972: 23); enquanto Donato apresenta-o "impiedoso conquistador, feroz perseguidor de índios." (1985: 110). 
No Vale do Pardo as atrocidades cometidas pelos invasores não foram menores. Um historiado retroativo às origens, não deixou dúvidas quanto às ações do posseiro Manoel Francisco Soares que "muito combateu contra a horda de indígenas ferozes, que infestaram estas paragens." (Correio do Sertão, 19/07/1902: 3). 
O relato significou a limpeza étnica, principalmente contra o Caingangue, identificado na região, acertada ou erradamente, como Bororo (O Progresso, 19/02/1905: 2) ou assim apelidado, povo tido praticante do canibalismo por suspeitas sustentadas em testemunhos fantasiosos que davam ao governo de São Paulo a justificativa da matança, com o consentimento calado da Igreja. 
Tradições revelam que o Caingangue tinha predileção por botas, e sempre que podia despojava delas os cadáveres, mas não tinha prática para retirá-las, então, a descarnização das pernas (Tidei Lima, 1978: 72-7) ou, na pressa, a decepação, quando não carregados os corpos até lugar seguro para tais procedimentos, para originar a suspeita da antropofagia.
Outra lenda revelava o Caingangue comedor de cachorros, quando na verdade apenas os atraía para distantes nas matas para matá-los, porque lhe denunciava presença nalguma ação contra os brancos.
A antropofagia Caingangue jamais foi comprovada e nem historicamente aceita.
-o-
Capítulo atualizado


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